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Artigo - Desempenho de tilápia geneticamente superior em diferentes densidades no período de inverno – Por Karla Miky Tsujii

Artigo - Desempenho de tilápia geneticamente superior em diferentes densidades no período de inverno – Por Karla Miky Tsujii

Data de Publicação: 11 de fevereiro de 2021 10:55:00 Para se iniciar uma atividade piscícola, temos que ter um conhecimento prévio do tipo de cultivo que pretendemos executar, seja em tanque escavado ou tanque- rede, levando em consideração as condições climáticas da região, para assim decidir a espécie que desejamos produzir, aplicar o manejo correto e o animal expressar seu desempenho

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*Por  Karla MikyTsujii

Nos últimos seis anos, a prática piscícola avançou 31%, visto que, em 2014, a produção foi de 579 toneladas, e em 2019 a produção alcançou 758 mil toneladas, um aumento de 4,9% em relação ao ano anterior (723 toneladas). A tilápia do Nilo (Oreochromisniloticus) representa 57% da produção nacional, enquanto, os peixes nativos representam 38% da produção total de pescado produzido (PEIXE BR, 2020).

Variedade Tilamax- UEM (Foto Karla Tsujii)

A temperatura é uma das condições ambientais que mais influenciam na produção de animais aquáticos. A tilápia é considerada uma espécie ectotérmica (GILLOOLY et al., 2001) e sua temperatura corporal e metabolismos estão diretamente ligadas com a variação de temperatura do ambiente. Sendo assim, mudanças na temperatura influenciam no seu metabolismo fisiológico, pois uma vez que não estão em sua zona de conforto, sendo temperaturas mais altas ou mais baixas, podem ocorrer alterações no consumo de ração, digestibilidade e aproveitamento dos nutrientes, assim acarretando um menor ganho de peso, afetando a reprodução e até ocasionando a mortalidade.

Para se iniciar uma atividade piscícola, temos que ter um conhecimento prévio do tipo de cultivo que pretendemos executar, seja em tanque escavado ou tanque- rede, levando em consideração as condições climáticas da região, para assim decidir a espécie que desejamos produzir, aplicar o manejo correto e o animal expressar seu desempenho. Sendo assim, tilápias melhoradas, tem seu potencial de desempenho prejudicado em períodos de inverno em alta densidade?

A piscicultura brasileira é uma atividade em potencial crescimento, visto o Brasil ser país de clima tropical, com sua posição geográfica favorecendo a sazonalidade, apresentando condições favoráveis para a atividade. No entanto, o clima é uma característica que não pode ser controlada, e algumas regiões podem apresentar temperaturas baixas em certos períodos, que não são consideradas adequadas para o desenvolvimento do animal.

Disposição dos tanques- rede na Unidade demonstrativa de tanques- rede no reservatório de Rosana – Rio do Corvo (Foto: Karla MikyTsujii)

A tilápia é um peixe de clima tropical, que expressa melhor seu potencial de produção em temperaturas que variam de 27 a 32ºC (OSTRENSKY; BOEGER, 1998). Apesar de serem apreciadas pela sua rusticidade, tolerando alterações nos parâmetros da água, como pH, oxigênio dissolvido, amônia, temperatura entre outros (EL-SAYED, 2006), o seu desenvolvimento e capacidade de expressar seu potencial genético fica comprometido com as adversidades ambientais.

O sistema de criação de peixes em tanque- rede é uma técnica de produção intensiva, sendo uma atividade que pode ser praticada em diversos ambientes aquáticos (ROTTA, 2003). Essa forma de cultivo tem se tornado popular pela facilidade de manejo, alta capacidade de estocagem e retorno rápido de investimento, características primordiais para viabilizar a técnica. No entanto, apesar das tilápias suportarem a alta densidade, um mau planejamento pode interferir na produção, podendo gerar estresse por competição por oxigênio, deficiência nutricional ou enfermidades, consequentemente, afetando o desempenho produtivo pelo baixo crescimento dos peixes ou mortalidade (ITUASSU, 2015).

São amplos os fatores que afetam a otimização do sistema de produção, por não se ter conhecimento e controle na densidade de peixes alocados (GOMES, 2000). Segundo Maedaet al. (2010), uma densidade de estocagem ideal é representada pela maior quantidade de peixes produzida eficientemente por unidade de área ou volume de um tanque, sendo que, uma produção eficiente não significa necessariamente o peso máximo atingido, mas sim o peso que pode ser atingido com uma baixa conversão alimentar, num período razoavelmente curto e com um peso final aceito pelo mercado consumidor. Sendo assim, a determinação ideal de densidade de estocagem para um sistema de produção em tanques-rede, torna-se um fator critico para o sucesso do investimento.

Desafio de estocagem e clima

Separação dos animais nos tanques- redes (Foto: Karla Tsujii)

Visto que a temperatura e a densidade de estocagem afetam diretamente o desempenho dos animais, quanto ao seu crescimento e sobrevivência, um estudo foi realizado pelo grupo de pesquisa PeixeGen,  da Universidade Estadual de Maringá – PR, na Unidade demonstrativa de tanques- rede no reservatório de Rosana, Rio do Corvo, localizado no município de Diamante do Norte (22° 39' 24'' S 52° 46' 51'' O), no Estado do Paraná, para avaliar o desenvolvimento de tilápias melhoradas no clima mais frio.

Para a avaliação de crescimento, foram utilizadas tilápias, da variedade Tilamax- UEM, desenvolvida no programa de melhoramento genético de tilápia do Nilo da UEM (PMGT – Tilamax/UEM), resultado da importação de animais da variedade GIFT da Malásia, no ano 2005, fruto de uma parceria entre a WorldFish Center e a UEM (OLIVEIRA et al., 2016). Os animais foram classificados em dois grupos genéticos: 1 - alto valor genético (desempenho superior), e 2 - baixo valor genético (desempenho inferior), invertidas sexualmente e submetidas a quatro diferentes densidades (75, 125, 175 e 225 kg/m3), no período de junho a setembro de 2019, totalizando 120 dias.

Para avaliar as densidades, foram utilizados 24 tanques- rede de 1 m3, e os animais foram divididos de forma de aleatória, de acordo com a densidade estipulada e o grupo genético que pertenciam. Foram utilizadas no total de 3.600 peixes, com 1.800 animais de alto valor genético e 1.800 animais de baixo valor genético. Os parâmetros físicos da água foram monitorados diariamente às 8h e 17h (Tabela 1), sendo mensurado o oxigênio dissolvido, temperatura da água e do ambiente e pH. Durante todo experimento, os animais receberam ração comercial balanceada na fase de crescimento e na fase de engorda, (>100 g) contendo 36% e 32% PB e 3075 kcal kg-1 de energia digestível, fornecidas de acordo com a exigência e fase da espécie.

Tabela 1. Temperatura média da água durante o período experimental

Manhã

Tarde

Água

Ar

Água

Ar

Junho

22,66 ± 1,04

16,91 ± 2,23

23,00 ± 0,92

24,16 ± 2,17

Julho

21,00 ± 1,42

14,61 ± 3,83

21,17 ± 1,11

22,39 ± 3,56

Agosto

21,00 ± 0,91

16,30 ± 2,89

21,45 ± 1,06

25,40 ± 2,46

Setembro

24,07 ± 1,01

19,77 ± 2,94

24,30 ± 1,12

28,87 ± 3,42

Para se avaliar o desempenho produtivo, a cada 30 dias, 10% dos peixes presentes no tanque eram submetidos a uma biometriade forma aleatória, para a mensuração de ganho de peso no período e ajuste de arraçoamento, com 2% da biomassa total do tanque.  Após o período experimental de 120 dias, os peixes passaram por jejum de 24 horas para esvaziamento do trato digestório, todos os peixes foram pesados individualmente, sendo determinado o peso final e contados para mensurar a sobrevivência. A taxa de mortalidade não foi significativa, visto que é esperado uma mortalidade de aproximadamente 15% em tanque de pequeno volume (FURLANETO et al., 2006), a sobrevivência de animais de alto valor genético foi de 91% e de baixo valor genético de 83,5%, assim se mantendo no esperado. Durante todo experimento, os parâmetros químicos da água permaneceram de acordo com a espécie (BOYD, 2019).

Uma vez avaliado o clima onde se vai iniciar a atividade, os cuidados para evitar perdas durante o processo de cultivo devem ser bem avaliadas, como arraçoamento e manejo dos animais (o que deve ser evitado ao máximo), assim, minimizando perdas devido às baixas temperaturas ou variações da mesma.

Fisiologicamente, o crescimento dos peixes, está diretamente ligada a temperatura do ambiente onde estão inseridas, sendo assim, baixas temperaturas inibem sua alimentação, consequentemente, diminuindo seu metabolismo. São diversos fatores que atuam no desempenho e sobrevivência de tilápias em sistema de cultivo em tanques-rede, dentre eles, densidade de estocagem, qualidade da água, genética, manejo, entre outras.

De acordo com Fülber et al. (2009), os sistemas intensivos de produção precisam ser melhor estudados, para se definir densidades adequadas, pois quando avaliou três linhagens diferentes de tilápia do Nilo (Oreochromisniloticus), sendo elas Bouaké, Chitralada e GIFT, o potencial genético não foi o único fator determinante para crescimento. No entanto, a linhagem GIFT apresentou melhor desempenho em menor densidade, comparado às outras duas linhagens.

Podemos observar, na figura 1, que houve maior desempenho dos animais de alto valor genético, quando comparados aos animais de baixo valor genético. Porém, verificou-se que com o aumento da densidade de estocagem, houve redução nos valores médios de peso corporal, ganho de peso e ganho de peso diário (GPD).Os grupos genéticos foram comparados utilizando métodos estatísticos apropriados, realizados por softwares estatísticos usualmente adotados por pesquisadores para este tipo de análise.

Figura 1. Representação gráfica do Peso corporal (A), ganho de peso (B) e ganho de peso diário(C) em função da densidade

 

Em razão do grupo genético e a densidade de estocagem atuarem de forma separada, não houve diferença significa na interação dessas duas variáveis. No entanto, podemos observar, que mesmo com o desafio de clima frio e altas densidades, o grupo de animais com alto valor genético obteve maiores desempenhos nas variáveis analisadas.

De acordo com Oliveira et al. (2016), os ganhos genéticos podem atingir 3,8% em crescimento anual, para características de ganho de peso diário e ganho de peso por período de cultivo, podendo acumular cerca de 15% em quatro gerações. O estudo demonstra superioridade genética aos indivíduos selecionados anteriormente. Dados de seleção de cinco anos da tilápia do Nilo no Brasil, podem ser encontrados no artigo “Correlatedchanges in bodyshapeafterfivegenerationsofselectionto improve growth rate in a breedingprogramfor Niletilapia(Oreochromisniloticus) in Brazil”.

De acordo com a FAO (2020), as pesquisas voltadas para o melhoramento genético de animais aquáticos têm como objetivo desenvolver alevinos e reprodutores de alta qualidade, assim aumentando a eficiência da produção e melhorando a saúde dos animais. Sendo assim, a partir do trabalho desenvolvido pelo grupo de pesquisa PeixeGen, podemos ressaltar que o animais melhorados e selecionados geneticamente, não tem seu desenvolvimento prejudicado no período de inverno, desempenhando seu potencial de crescimento mesmo em condições que não são favoráveis.

 

 

*Karla MikyTsujii, graduada pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), com título em bacharel em Zootecnia, concluído em 2016. Mestre em Produção e nutrição de não ruminantes pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Atualmente está concluindo o doutorado pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), na área de Produção Animal, com ênfase em aquicultura. Faz parte do grupo PeixeGen – UEM desde 2018 atuando na área de biologia molecular, melhoramento genético e reprodução de peixes (ZebraFish, carpas Nishikigoi e tilápia do Nilo)

 

COLABORADORES

Eric Costa Campos1, Filipe Chagas Teodózio de Araújo1, Humberto Todesco1, Laís Santana Celestino Mantovani1, Alex Júnio da Silva Cardoso2, Carlos Antonio Lopes de Oliveira3, Ricardo Pereira Ribeiro3

1*Universidade Estadual de Maringá (UEM), Departamento de Zootecnia. Programa de Pós- Graduação em zootecnia, CEP: 87020-900, Maringá, PR, Brasil. Email: karlatsujii@gmail.com. Autor para correspondência.

2 Universidade Federal de Viçosa (UFV), Departamento de Zootecnia. Prgrama de Pós- Graduação em zootecnia

3 Professores do programa de Pós-Graduação em Zootecnia da UEM

PeixeGen – Grupo de Manejo, Melhoramento e Genética Molecular em Piscicultura de Água Doce

REFERÊNCIAS

BOYD, Claude E. Water quality: an introduction. Springer Nature, 2019.

EL-SAYED, Abdel-Fattah M. Tilapia culture in salt water: environmental requirements, nutritional implications and economic potentials. Avances en NutricionAcuicola, 2006.

FAO - AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS. FISHERIES DEPARTMENT. The State of World Fisheries and Aquaculture, 2000. Food&Agriculture Org., 2000.

FÜLBER, VaniceMarli et al. Desempenho comparativo de três linhagens de tilápia do Nilo Oreochromisniloticus em diferentes densidades de estocagem. Acta Scientiarum. Animal Sciences, v. 31, n. 2, p. 177-182, 2009.

FURLANETO, F. P; AYROZA, D. M. M. R.; AYROZA, L. M. S. Custo e rentabilidade da produção de tilápia (Oreochromis spp.) em tanque-rede no Médio Paranapanema, Estado de São Paulo, safra 2004/05. Informações econômicas, v. 36, n. 3, p. 63-69, 2006.

GILLOOLY, James F. et al. Effects of size and temperature on metabolic rate. science, v. 293, n. 5538, p. 2248-2251, 2001.

GOMES, Levy de Carvalho et al. Biologia do jundiá Rhamdiaquelen (TELEOSTEI, PIMELODIDAE). Ciência Rural, v. 30, n. 1, p. 179-185, 2000.

ITUASSU, D. R. Cálculo de povoamento de viveiros e tanques-rede. Embrapa Agrossilvipastoril-Circular Técnica (INFOTECA-E), 2015.

DE OLIVEIRA, Carlos Antonio Lopes et al. Correlated changes in body shape after five generations of selection to improve growth rate in a breeding program for Nile tilapia Oreochromisniloticus in Brazil. JournalofAppliedGenetics, v. 57, n. 4, p. 487-493, 2016.

OSTRENSKY, A.; BOEGER, W. Piscicultura: Fundamentos e Técnicas de Manejo. Guaíba: Agropecuária, Rio Grande do Sul, 211 p., 1998.

MAEDA, Henrique et al. Efeitos da densidade de estocagem na segunda alevinagem de tilápia nilótica (Oreochromisniloticus), em sistema raceway. Ciência Animal Brasileira, v. 7, n. 3, p. 265-272, 2006.

PEIXE-BR. Anuário Peixe Br da Piscicultura 2020. Associação Brasileira de Piscicultura, p. 1–136, 2020.

ROTTA, M. A.; DE QUEIROZ, J. F. Boas práticas de manejo (BPMs) para a produção de peixes em tanques-redes. Embrapa Pantanal-Documentos (INFOTECA-E), 2003.

 

 

 

 

 

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